Disciplina o procedimento para reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelas comunidades quilombolas de que tratam o art. 229 da Constituição do Estado do Maranhão, a Lei Estadual nº 9.169, de 16 de abril de 2010 e o Decreto Estadual nº 32.433, de 23 de novembro de 2016.

O Secretário de Estado da Agricultura Familiar do Maranhão, no uso da competência privativa estabelecida no artigo 4º, alínea ‘b’ da Lei nº 8.959 de 08 de maio de 2009 e cumprindo o que determina o art. 4º do Decreto Estadual nº 32.433 de 23 de novembro de 2016, que regulamenta a Lei Estadual nº 9.169, de 16 de abril de 2010, RESOLVE disciplinar o procedimento administrativo para reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pelos remanescentes das comunidades dos quilombos, na forma a seguir:

Art. 1º. A presente Instrução Normativa estabelece os procedimentos do processo administrativo para reconhecimento, delimitação, demarcação, titulação da propriedade dos territórios ocupados pelos remanescentes das comunidades dos quilombos.

Art. 2º. As ações objeto da presente Instrução Normativa têm como fundamentação legal:

I- Art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal;

II- Convenção Internacional nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre povos indígenas e tribais, promulgada pelo Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004;

III- Art. 229 da Constituição do Estado do Maranhão;

IV- Lei Estadual nº 9.169, de 16 de abril de 2010;

V- Decreto Estadual nº 32.433, de 23 de novembro de 2016.

Art. 3º. Consideram-se comunidades quilombolas os grupos étnico-raciais, segundo critérios de autodefinição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida.

Art. 4º. Consideram-se territórios ocupados por comunidades quilombolas, toda a terra utilizada para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural.

Art. 5º. Compete ao Instituto de Colonização e Terras do Estado do Maranhão (ITERMA) o reconhecimento, a delimitação, a demarcação e a titulação da propriedade dos territórios ocupados por comunidades quilombolas, sem prejuízo da competência comum e concorrentes da União e dos Municípios.

Art. 6º. A caracterização dos territórios ocupados por comunidades quilombolas será atestada mediante autodefinição da comunidade.

§ 1º. Esta autodefinição poderá ser atestada por meio de certidão emitida por Órgãos ou Setores de Secretarias Municipais ou pela Secretaria de Estado de Igualdade Racial, além da certificação da Fundação Cultural Palmares (FCP). Em todos os casos, a certificação poderá ser juntada até o fim do processo de titulação dos territórios, não sendo condicionante para a abertura do procedimento administrativo.

Art. 7º. O processo administrativo terá início por requerimento de qualquer interessado, das entidades ou associações representativas das comunidades quilombolas ou de ofício pelo ITERMA, sendo entendido como simples manifestação da vontade parte, apresentada por escrito.

Parágrafo único. Compete à comunidade ou interessado apresentar informações sobre a localização da área objeto de identificação, por qualquer meio legítimo que melhor lhe convier.

Art. 8º. O estudo e o reconhecimento do território reivindicado serão coordenados pela Comissão de Territórios Tradicionais, composta por membros do quadro funcional do ITERMA.

§ 1º. A Comissão de Territórios Tradicionais será responsável por:

I – Dar seguimento aos processos administrativos de regularização fundiária com base na Lei nº 9.169/2010 e no Decreto Estadual nº 32.433/2016 e nesta Instrução Normativa;

II – Desenvolver o Diagnóstico de Identificação e Delimitação (DID), coordenando o Grupo de Trabalho Interdisciplinar (GTI) nos trabalhos de campo e na sistematização de relatórios;

III – Realizar articulações com secretarias estaduais e municipais, bem como organizações não governamentais representativas de povos e comunidades tradicionais;

IV – Contribuir com as reuniões da Mesa quilombola para Questões Agrárias e Fundiárias, no que tange à convocação dos membros, facilitação das mesas, intermediação entre os Órgãos e as comunidades quilombolas, arquivamento de documentos relativos, entre outros.

Art. 9º. O estudo e o reconhecimento do território reivindicado serão precedidos de reuniões com a comunidade e membros da Comissão de Territórios Tradicionais para apresentação dos procedimentos que serão adotados.

Art. 10º. A identificação dos limites dos territórios das comunidades quilombolas a que se refere o art. 4º, deve ser feita a partir de indicações da própria comunidade, bem como a partir de estudos técnicos e/ou científicos, consistirá na caracterização espacial, histórica, econômica, ambiental e sociocultural do território ocupado pela comunidade, mediante Diagnóstico de Identificação e Delimitação (DID), com elaboração a cargo do Grupo de Trabalho Interdisciplinar, coordenado pela Comissão de Territórios Tradicionais do ITERMA.

Parágrafo Único. A demarcação e o georreferenciamento do território identificado e reconhecido será realizada observando os procedimentos contidos na Norma Técnica para Georrefenciamento de Imóveis Rurais vigente.

Art. 11º. Para o desenvolvimento do DID, um Grupo de Trabalho Interdisciplinar (GTI), constituído com finalidade específica no âmbito do ITERMA, deve desenvolver os trabalhos de coleta de dados e sua respectiva sistematização para elaboração dos relatórios técnicos (ocupacional, fundiário e cartorial) que devem compor o DID.

§ 1º. O ITERMA, antes da constituição do GTI, convidará a Secretaria de Estado da Agricultura Familiar- SAF, a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular- SEDPHOP e a Secretaria Extraordinária de Igualdade Racial- SEIR para indicar membros§ 2. A não participação dos membros convidados no GTI ou num determinado processo de regularização, não impedirá o andamento dos processos.

Art. 12º. O DID, fundamentado em elementos objetivos, terá informações gerais que versam sobre aspectos socioculturais, históricos, produtivos, geográficos, fundiários e cartoriais obtidos em campo junto as comunidades e em acervos de instituições públicas e privadas, entre outras informações consideradas relevantes pela Comissão de Territórios Tradicionais e/ou Grupo de Trabalho Interdisciplinar, dados gerais e específicos organizados da seguinte forma:

I – Relatório do Levantamento Ocupacional, contendo, sintética caracterização sociocultural, histórica, econômica e produtiva, ambiental e geográfica da área quilombola identificada, com as seguintes informações:

a) apresentação dos conceitos e concepções empregados no DID (referencial teórico), que observem os critérios de autodefinição, que permita caracterizar a trajetória histórica própria, as relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida;

b) apresentação da metodologia e dos condicionantes dos trabalhos, contendo, dentre outras informações, as relativas à organização e caracterização da equipe técnica envolvida, ao cronograma de trabalho executado, ao processo de levantamento de dados qualitativos utilizados e ao contexto das condições de trabalho de campo e elaboração do relatório;

c) informações gerais sobre o grupo autodefinido como comunidade tradicional quilombola, tais como, identificação e denominação das comunidades incidentes no território, aspectos sociais, localização espacial, formas de acesso e infraestrutura básica;

d) descrição do histórico da ocupação da área com base na memória coletiva do grupo envolvido e depoimentos de eventuais atores externos identificados, bem como estudos técnicos ou científicos. Neste contexto, pode ser juntado o histórico apresentado a Fundação Cultural Palmares, caso a comunidade já tenha sua certidão de autodefinição;

e) descrição sucinta, caso haja, de sítios que contenham reminiscências históricas do quilombo, assim como de outros sítios considerados relevantes para o modo de vida do grupo, a exemplo de espaços considerados sagrados, áreas de uso comum para produção, pontos de ameaça ou conflito, dentre outros;

f) descrição de práticas tradicionais de caráter coletivo e sua relação com a ocupação atual da área identificando as terras destinadas à moradia, espaços de sociabilidade destinados às manifestações culturais, atividades de caráter social, político e econômico, demonstrando as razões pelas quais são importantes para a manutenção da memória e identidade do grupo e de outros aspectos coletivos próprios da comunidade;

g) identificação e descrição das áreas imprescindíveis à preservação dos recursos necessários ao bem estar econômico e cultural da comunidade e explicitação de suas razões;

II – Relatório do Levantamento Fundiário, contendo, preferencialmente, as seguintes descrições e informações:

a) identificação e censo de ocupantes quilombolas e nãoquilombolas, com descrição das áreas por eles ocupadas, localizadas por coordenadas geográficas (Universal Transversa de Mercator);

b) descrição das áreas pertencentes ao território reivindicado que têm título de propriedade, contendo listagem em anexo preferencialmente com os seguintes dados: nome do proprietário, CPF, denominação do imóvel, área registrada em hectare, as benfeitorias e a avaliação do imóvel.

c) descrição das áreas pertencentes ao território reivindicado que têm área de posse (em nome de não quilombolas), contendo listagem em anexo preferencialmente com os seguintes dados: nome do proprietário, CPF, denominação do imóvel, área registrada em hectare e as benfeitorias.

III- planta e memorial descritivo do perímetro da área reivindicada pelas comunidades quilombolas.

§ 1º. Com a finalização do processo de demarcação, o ITERMA irá lançar os dados cartográficos em sua malha fundiária para que fique registrado o perímetro do território reivindicado.

§ 2º. Após a demarcação, o ITERMA irá notificar às Serventias Extrajudiciais de Registro de Imóveis sobre a instauração do processo administrativo de regularização fundiária, anexando cópia da planta e do memorial descritivo.

IV- Relatório do Levantamento Cartorial com informações sobre a natureza das ocupações não-quilombolas, contendo a identificação dos títulos de domínio ou posses eventualmente existentes, bem como estudo e análise da cadeia dominial.

§ 1º. Na hipótese do estudo da cadeia dominial evidenciar suposta fraude nos títulos de domínio ou na cadeia dominial sucessória de área incidente no território, o ITERMA encaminhará o fato ao conhecimento do Ministério Público e a Delegacia Agrária.

V – Cadastramento das famílias quilombolas, utilizando-se formulários específicos do ITERMA, contendo a identificação dos chefes de família, dados socioeconômicos relativos a unidade familiar de consumo e de produção e, dados referentes ao processo de ocupação do território, dentre outros entendidos como pertinente pela Comissão de Territórios Tradicionais e/ou Grupo de Trabalho Interdisciplinar.

VI – parecer jurídico conclusivo sobre a proposta de área, considerando os estudos e documentos apresentados.

§ 1º. Fica facultado à comunidade interessada apresentar peças técnicas ou mesmo arquivos do acervo comunitário que possam subsidiar à instrução do DID, as quais poderão ser utilizadas pelo Grupo de Trabalho Interdisciplinar.

§ 2º. Fica assegurada à comunidade interessada a participação em todas as fases do procedimento administrativo de elaboração do DID, diretamente ou por meio de representantes por ela indicados.

§ 3º. No processo de elaboração do DID deverão ser respeitados os direitos da comunidade de:

I – ser informada sobre a natureza do trabalho;

II – autorizar que as informações obtidas no âmbito do DID sejam utilizadas para outros fins; e

III – acesso aos resultados do levantamento ocupacional e fundiário realizado.

Art. 13º. Estando em termos, o DID será submetido à análise preliminar da Comissão de Territórios Tradicionais do ITERMA que, verificando o atendimento dos critérios estabelecidos para sua elaboração, o remeterá a Presidência do ITERMA, para elaboração e publica do seu quadro funcional para compor o GTI. Os mesmos devem ser indicados por meio de portaria, instrumento em que também podem ser previstas as competências relacionadas a elaboração do DID. ção do edital, por duas vezes consecutivas, no prazo de 20 (vinte) dias, no Diário Oficial do Estado do Maranhão e no Diário Oficial do Município, caso exista, onde se localiza a área sob estudo, contendo as seguintes informações:

I – denominação do imóvel ocupado pelos remanescentes das comunidades dos quilombos;

II – circunscrição em que está situado o imóvel;

III – limites, confrontações e dimensão constantes do memorial descritivo do território a ser titulado; e

IV- títulos, registros e matrículas eventualmente incidentes sobre o território consideradas suscetíveis de reconhecimento e demarcação, nos termos da Lei nº 9.169, de 16 de abril de 2010.

§ 1º. A publicação será afixada na sede da Prefeitura Municipal e do sindicato dos trabalhadores e trabalhadoras rurais onde está situado o imóvel.

§ 2º. Na hipótese do DID concluir pela impossibilidade do regularização da área estudada como território ocupado por remanescentes das comunidades dos quilombos, a Comissão de Territórios Tradicionais do ITERMA, após ouvidos os setores técnicos e a Procuradoria Jurídica, deverá determinar diligências complementares ao processo de regularização, seja propondo novas discussões sobre os limites territoriais, ou propondo outros instrumentos de reordenamento agrário, ou ainda, anuindo com do resultado do Diagnóstico, determinar o arquivamento do processo administrativo.

§ 3º. No caso do ITERMA não reconhecer a totalidade do território reivindicado deverá ser encaminhado uma notificação ao proponente do processo, bem como aos representantes das comunidades diretamente afetadas, com prazo de 30 (trinta) dias para recurso;

§ 4º. Da decisão de arquivamento do processo administrativo, de que trata o § 2º, caberá pedido de desarquivamento, desde que justificado.

Art. 14º. Todos os interessados terão o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, após a publicação e as notificações a que se refere o art. 13, para contestarem o DID junto à Comissão de Territórios Tradicionais do ITERMA, juntando as provas pertinentes.

Parágrafo único. As contestações oferecidas pelos interessados serão recebidas nos efeitos devolutivo e suspensivo.

Art. 15º. As contestações dos interessados serão analisadas e julgadas pela Procuradoria Jurídica do ITERMA.

§ 1º. Se o julgamento das contestações implicar a alteração das informações contidas no edital de que trata o art. 13º, será realizada nova publicação e a notificação dos interessados.

§ 2º. Se o julgamento das contestações não implicar a alteração das informações contidas no edital de que trata o art. 13º, serão notificados os interessados que as ofereceram.

§ 3º. Não havendo impugnações ou sendo elas rejeitadas, o ITERMA concluirá o trabalho de titulação do território ocupado por remanescentes das comunidades dos quilombos.

Art. 16º. Em sendo constatado que o território ocupado por remanescentes das comunidades dos quilombos incida sobre terras de propriedade da União, o ITERMA encaminhará os autos para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

Art. 17º. Caso seja constatado que a integralidade de determinado território ocupado por remanescentes das comunidades dos quilombos incida, concomitantemente, sobre área de propriedade do Estado do Maranhão e área de propriedade da União ou particular, o ITERMA e o INCRA poderão firmar termo de cooperação para consecução da sua delimitação, demarcação e titulação.

Art. 18º. O Presidente do ITERMA realizará a titulação mediante a outorga de título coletivo e pró indiviso aos remanescentes das comunidades dos quilombos, em nome de sua associação legalmente constituída, sem nenhum ônus financeiro, com obrigatória inserção de cláusula de inalienabilidade, imprescritibilidade e de impenhorabilidade, devidamente registrada no Serviço Registral da Comarca de localização das áreas.

Art. 19º. A expedição do título e o registro cadastral a serem procedidos pelo ITERMA far-se-ão sem ônus de qualquer espécie aos remanescentes das comunidades dos quilombos, independentemente do tamanho da área.

Art. 20º. As disposições contidas nesta Instrução Normativa incidem sobre os procedimentos administrativos de reconhecimento em andamento, em qualquer fase em que se encontrem.

Art. 21º. As despesas decorrentes da aplicação das disposições contidas nesta Instrução correrão à conta das dotações orçamentárias consignadas na Lei Orçamentária Anual para tal finalidade, observados os limites de movimentação, de empenho e de pagamento.

Art. 22º. Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.

 

Esse texto não substitui o publicado no Diário Oficial do Maranhão em 3 de abril de 2018.