A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE GOIÁS, nos termos do art. 10 da Constituição Estadual, decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1º Fica instituída a Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

Art. 2º Para efeitos desta Lei compreende-se por:
I – povos e comunidades tradicionais: grupos culturalmente diferenciados e que se reconhecem como tais, que possuem formas próprias de organização social, que ocupam e usam territórios e recursos naturais como condição para sua reprodução cultural, social, religiosa, ancestral e econômica, utilizando conhecimentos, inovações e práticas gerados e transmitidos pela tradição;
II – territórios tradicionais: os espaços necessários a reprodução cultural, social e econômica dos povos e comunidades tradicionais, sejam eles utilizados de forma permanente ou temporária, observado, no que diz respeito aos povos indígenas e quilombolas, respectivamente, o que dispõem os arts. 231 da Constituição e 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias e demais regulamentações; e
III – desenvolvimento sustentável: o uso equilibrado dos recursos naturais, voltado para a melhoria da qualidade de vida da presente geração, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras.

CAPÍTULO I
PRINCÍPIOS

Art. 3º As ações e atividades voltadas para o alcance dos objetivos da Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais deverão ocorrer de forma intersetorial, integrada, coordenada, sistemática e observar os seguintes princípios:
I – o reconhecimento, a valorização e o respeito à diversidade socioambiental e cultural dos povos e comunidades tradicionais, levando– se em conta, dentre outros aspectos, os recortes etnia, raça, gênero, idade, religiosidade, ancestralidade, orientação sexual e atividades laborais, entre outros, bem como a relação desses em cada comunidade ou povo, de modo a não desrespeitar, subsumir ou negligenciar as diferenças dos mesmos grupos, comunidades ou povos ou, ainda, instaurar ou reforçar qualquer relação de desigualdade;
II – a visibilidade dos povos e comunidades tradicionais deve se expressar por meio do pleno e efetivo exercício da cidadania;
III – a segurança alimentar e nutricional como direito dos povos e comunidades tradicionais ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis;
IV – o acesso em linguagem acessível à informação e ao conhecimento dos documentos produzidos e utilizados no âmbito da Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais;
V – o desenvolvimento sustentável como promoção da melhoria da qualidade de vida dos povos e comunidades tradicionais nas gerações atuais, garantindo as mesmas possibilidades para as gerações futuras e respeitando os seus modos de vida e as suas tradições;
VI – a pluralidade socioambiental, econômica e cultural das comunidades e dos povos tradicionais que interagem nos diferentes biomas e ecossistemas, sejam em áreas rurais ou urbanas;
VII – a promoção da descentralização e transversalidade das ações e da ampla participação da sociedade civil na elaboração, monitoramento e execução desta Política a ser implementada pelas instâncias governamentais;
VIII – o reconhecimento e a consolidação dos direitos dos povos e comunidades tradicionais;
IX – a articulação com as demais políticas públicas relacionadas aos direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais nas diferentes esferas de governo;
X – a promoção dos meios necessários para a efetiva participação dos Povos e Comunidades Tradicionais nas instâncias de controle social e nos processos decisórios relacionados aos seus direitos e interesses;
XI – a articulação e integração com o Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional;
XII – a contribuição para a formação de uma sensibilização coletiva por parte dos órgãos públicos sobre a importância dos direitos humanos, econômicos, sociais, culturais, ambientais e do controle social para a garantia dos direitos dos povos e comunidades tradicionais;
XIII – a erradicação de todas as formas de discriminação, incluindo o combate à intolerância religiosa; e
XIV – a preservação dos direitos culturais, o exercício de práticas comunitárias, a memória cultural e a identidade racial e étnica.

CAPÍTULO II
OBJETIVO GERAL

Art. 4º A Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais tem como principal objetivo promover o desenvolvimento sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, com ênfase no reconhecimento, fortalecimento e garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, com respeito e valorização à sua identidade, suas formas de organização e suas instituições.

CAPÍTULO III
OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Art. 5º São objetivos específicos da Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais:
I – garantir aos povos e comunidades tradicionais seus territórios, e o acesso aos recursos naturais que tradicionalmente utilizam para sua reprodução física, cultural e econômica;
II – solucionar e/ou minimizar os conflitos gerados pela implantação de Unidades de Conservação de Proteção Integral em territórios tradicionais e estimular a criação de Unidades de Conservação de Uso Sustentável;
III – implantar infraestrutura adequada às realidades socioculturais e demandas dos povos e comunidades tradicionais;
IV – garantir os direitos dos povos e das comunidades tradicionais afetados direta ou indiretamente por projetos, obras e empreendimentos;
V – garantir e valorizar as formas tradicionais de educação e fortalecer processos dialógicos como contribuição ao desenvolvimento próprio de cada povo e comunidade, garantindo a participação e controle social tanto nos processos de formação educativos formais quanto nos não– formais;
VI – reconhecer, com celeridade, a auto identificação dos povos e comunidades tradicionais, de modo que possam ter acesso pleno aos seus direitos civis individuais e coletivos;
VII – garantir aos povos e comunidades tradicionais o acesso aos serviços de saúde de qualidade e adequados às suas características socioculturais, suas necessidades e demandas, com ênfase nas concepções e práticas da medicina tradicional;
VIII – garantir no sistema público previdenciário a adequação às especificidades dos povos e comunidades tradicionais, no que diz respeito às suas atividades ocupacionais e religiosas e às doenças decorrentes destas atividades;
IX – criar e implementar, urgentemente, uma política pública de saúde voltada aos povos e comunidades tradicionais;
X – garantir o acesso às políticas públicas sociais e a participação de representantes dos povos e comunidades tradicionais nas instâncias de controle social;
XI – garantir nos programas e ações de inclusão social recortes diferenciados voltados especificamente para os povos e comunidades tradicionais;
XII – implementar e fortalecer programas e ações voltados às relações de gênero nos povos e comunidades tradicionais, assegurando a visão e a participação feminina nas ações governamentais, valorizando a importância histórica das mulheres e sua liderança ética e sócia
XIII – garantir aos povos e comunidades tradicionais o acesso e a gestão facilitados aos recursos financeiros provenientes dos diferentes órgãos de governo;
XIV – assegurar o pleno exercício dos direitos individuais e coletivos concernentes aos povos e comunidades tradicionais, sobretudo nas situações de conflito ou ameaça à sua integridade;
XV – reconhecer, proteger e promover os direitos dos povos e comunidades tradicionais sobre os seus conhecimentos, práticas e usos tradicionais;
XVI – apoiar e garantir o processo de formalização institucional, quando necessário, considerando as formas tradicionais de organização e representação locais; e
XVII – apoiar e garantir a inclusão produtiva com a promoção de tecnologias sustentáveis, respeitando o sistema de organização social dos povos e comunidades tradicionais, valorizando os recursos naturais locais e práticas, saberes e tecnologias tradicionais.

CAPÍTULO IV
DOS INSTRUMENTOS DE IMPLEMENTAÇÃO

Art. 6º São instrumentos de implementação da Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais:
I – os Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais;
II – os fóruns regionais e locais; e
III – o Plano Plurianual.

CAPÍTULO V
DOS PLANOS DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS

Art. 7º Os Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais têm por objetivo fundamentar e orientar a implementação da Política Estadual de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais e consistem no conjunto das ações de curto, médio e longo prazo, elaboradas com o fim de implementar, nas diferentes esferas de governo, os princípios e os objetivos estabelecidos por esta Política:
I – os Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais poderão ser estabelecidos com base em parâmetros ambientais, regionais, temáticos, étnico– sócio– culturais e deverão ser elaborados com a participação equitativa dos representantes de órgãos governamentais e dos povos e comunidades tradicionais envolvidos;
II – a elaboração e implementação dos Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais poderá se dar por meio de fóruns especialmente criados para esta finalidade ou de outros cuja composição, área de abrangência e finalidade sejam compatíveis com o alcance dos objetivos desta Política; e
III – o estabelecimento de Planos de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais não é limitado, desde que respeitada a atenção equiparada aos diversos segmentos dos povos e comunidades tradicionais, de modo a não convergirem exclusivamente para um tema, região, povo ou comunidade.

Art. 8º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Goiânia, 25 de maio de 2021; 133º da República.

RONALDO CAIADO
Governador do Estado

ANTÔNIO GOMIDE
Deputado Estadual

 

Este texto não substitui o publicado no D.O de 26/05/2021.