O programa aborda os desafios para a retomada do ensino presencial nas escolas quilombolas, indígenas e ribeirinhas. Uma das preocupações é que as escolas não estão preparadas para os protocolos de prevenção ao coronavírus
Assim como no resto do Brasil, as comunidades tradicionais de Oriximiná e Óbidos, no norte do Pará, estão debatendo um dos assuntos mais complexos gerados pela pandemia: a volta às aulas. Para falar sobre o tema, o segundo episódio do podcast da Comissão Pró-Índio contou com a participação de lideranças comunitárias, educadores e especialistas.
A principal preocupação é com o fato de as escolas não estarem sendo preparadas para os novos protocolos. “As escolas nas comunidades não têm estrutura para garantir a segurança das crianças seguindo todos os protocolos de segurança. É muito precária. Às vezes, as crianças trazem água de casa”, relata Cleone Souza Matos, liderança da Terra Quilombola Peruana, em Óbidos.
Além de alunos e professores, toda comunidade pode ser afetada. “Existem famílias indígenas que moram junto com as crianças, principalmente idosos”, conta Eduardo Waiwai, diretor da Escola Indígena Waiwai, em Oriximiná. “Na minha visão, ainda não é o momento de voltar”.
“A gente precisa de tempo. As crianças estão perdendo um ano de aula, mas a gente precisa de tempo para encontrar saídas. Precisa de tempo para produzir a vacina também”, pontua o epidemiologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, Diego Xavier. Ele destaca algumas condições para reabrir as escolas: “A gente precisaria testar toda a comunidade escolar, mas o tipo de teste que a gente acha a pessoa que está transmitindo, que é o PCR, que é um teste mais difícil de ser feito do que o teste rápido. À medida que eu acho um caso, por exemplo, eu identifico um aluno, eu vou isolar a família dele, os contatos dele, para interromper a cadeia de transmissão.”
Porém, os protocolos parecem muito distantes da realidade das comunidades, como aponta o professor Salomão Hage, coordenador do Fórum Paraense de Educação no Campo: “Está tudo muito fora do que acontece nas comunidades rurais. Nós temos escolas que se você for estabelecer 1,5m de distância de uma criança para outra, não estuda nem 1/3 das crianças. Nessas escolas, que são muitas, o professor está lá sozinho, não tem apoio de ninguém para ajudar na higiene da escola”. E Salomão alerta: “não há nenhum movimento do estado no sentido de garantir que essas condições que eles dizem que vão acontecer, realmente vão acontecer”.
O Ensino à Distância
Continuar com o ensino com a distância também é um impasse. “A dificuldade é a questão do uso de internet, o qual não temos acesso”, explica Maria de Fátima, professora comunidade ribeirinha Boa Nova. Ela está produzindo cadernos de atividade e entregando aos alunos. “Fazemos o possível para que chegue até nossas crianças, pois sabemos da importância que a educação tem em nossas vidas”.
O professor Salomão Hage, problematiza a solução de manter as aulas sem o devido apoio. “O ensino remoto parte desse processo de improvisação. Olhe, a gente briga por uma educação de qualidade, não por qualquer educação”. O questionamento é importante porque o aprendizado de hoje influenciará o rendimento dos alunos quando voltarem às aulas presenciais.