O Brasil ratificou a Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais da Organização Internacional do Trabalho em 2003. O Poder Judiciário vêm confirmando a aplicação da referida Convenção na proteção jurídica das comunidades quilombolas.

Caso Quilombolas de Santarém e Porto do Maicá (PA)

SENTENÇA
2ª Vara Federal de Santarém (PA)
Autores: Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado do Pará
Réus: União Federal, Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) e Empresa Brasileira de Portos de Santarém LTDA – EMBRAPS
Informações: Justiça Federal – Seção Judiciária do Pará
Data: 05/10/2019

Trecho:

Por fim, merece acolhida o pleito de retificação do EIA e do RIMA do empreendimento. Conforme exposto, o MPF trouxe aos autos documento elaborado pelo INCRA (fl. 132), o qual informa que há comunidades quilombolas incluídas na área de influência direta do empreendimento. Tal informação, oriunda do órgão oficial, tem o condão de inquinar o constante do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) elaborado no interesse da sociedade particular responsável pelo empreendimento, segundo o qual há apenas uma comunidade quilombola localizada nas proximidades, mas que não estaria inserida na área de influência direta do empreendimento (fl. 179-v).

No mais, o documento ignora que o curso d’água é utilizado por pescadores tradicionais e ribeirinhos, que notoriamente possuem relação com o local do empreendimento.

Eventual limite constante de ato regulamentar, que indicaria a distância na qual se presumiria impacto direto ou indireto do empreendimento, não pode se sobrepor à realidade dos fatos. No mais, a portaria Portaria Interministerial n. 60/2015, estabelece uma mera presunção, não afastando, mediante análise do caso concreto, que se conclua ser área de impacto maior (vide seu art. 3º, §3º). Ou seja, presume-se o impacto caso comunidades estejam abrangidas pelo raio previsto no ato regulamentar; porém, obviamente, trata-se de um patamar mínimo de proteção, pois os estudos respectivos devem avaliar, de forma fundamentada, se de fato os impactos são limitados a este raio ou se a área de influência é superior.

No presente caso, está evidente que os cursos d’água afetados pelo empreendimento são utilizados por comunidades e populações tradicionais que se encontram fora da área considerada como patamar mínimo de proteção. Os impactos do empreendimento, portanto, devem ser aferidos mediante estudo adequado, devidamente fundamentado, que exponha concretamente qual a real área de influência do empreendimento, em vista do seu porte.

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ACÓRDÃO
5ª Turma TRF-1ª Região
Agravantes: Empresa Brasileira de Portos de Santarém
Agravado: Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado do Pará
Informações: trf1.jus.br
Data: 03/05/2017

Trecho:

CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO, AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INSTALAÇÃO DE TERMINAL PORTUÁRIO ÀS MARGENS DO RIO AMAZONAS, NO MUNICÍPIO DE SANTARÉM/PA. ÁREA DE INFLUÊNCIA DIRETA EM COMUNIDADES QUILOMBOLAS E DEMAIS POPULAÇÕES TRADICIONAIS. LICENCIAMENTO AMBIENTAL. AUSÊNCIA DE CONSULTA PRÉVIA (CONVENÇÃO Nº 169 DA ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO). TUTELA INIBITÓRIA. CABIMENTO.
I – A instalação de terminal portuário encravado no seio da Amazônia Legal, com reflexos diretos não só nos ecossistemas ali existentes, mas, também, e em comunidades quilombolas e demais populares tradicionais ribeirinhas, demonstra a natureza de repercussão geral da controvérsia instaurada neste feito judicial, que, por sua natureza ontológica, é de caráter difuso-ambiental, a sobrepor-se a qualquer outro interesse de cunho político ou econômico, como no caso, ante o fenômeno da transcendência das questões discutidas no processo judicial, porque diretamente vinculadas à tradicional teoria da gravidade institucional, na visão da Corte Suprema da Argentina, já recepcionada pela doutrina, pela legislação processual (CPC/1973, arts. 543-A, § 1º, e 543-C, caput) e pela jurisprudência dos Tribunais do Brasil, na compreensão racional de que tais questões excedem ao mero interesse individual das partes e afetam de modo direto o da comunidade em geral, a desatrelar-se dos marcos regulatórios da congruência processual, na espécie.
(…)
III – Na hipótese dos autos, em se tratando de instalação de terminal portuário às margens do Rio Amazonas, no Município de Santarém/PA, cujo licenciamento, além de não  ter sido submetido ao crivo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, na condição de órgão executor da política nacional do meio ambiente, também não fora precedido de regular consulta prévia aos povos remanescentes das comunidades quilombolas e às demais populações tradicionais de ribeirinhos, diretamente afetadas, caracteriza, em princípio, a manifesta irregularidade do empreendimento, a autorizar a suspensão do aludido licenciamento, de forma a evitar danos irreversíveis ou de difícil ou incerta reparação, como no caso.
IV – Agravo de instrumento desprovido. Decisão mantida.

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Caso Cafundó (SP)

ACÓRDÃO
1ª Turma Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3)
Agravantes: Pedro Antonio De Paiva Latorre e Neusa Maria Grandino Latorre
Agravado: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
Informações: http://www.trf3.jus.br/
Data: 21/02/2017
Comunidade Quilombola: Cafundó (Salto de Pirapora-SP)

Trecho:

“No tocante à tese da parte agravante quanto à impossibilidade de desapropriação para atender ao disposto no artigo 68 do ADCT, esta não pode ser aceita, por se tratar de norma de eficácia plena, que assegura um direito dos quilombolas e um dever do Poder Público.
Nesta senda, cabe ao Poder Público adotar as medidas necessárias para assegurar o direito à terra aos remanescentes de comunidades de quilombos, tal como a adoção de atos expropriatórios, que encontra respaldo legal no artigo 14 da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, aprovada pelo Decreto Legislativo n.º 143, de 20 de junho de 2002 e promulgada pelo Decreto n.º 5.051, de 19 de abril de 2004, bem como no artigo 13 do Decreto n.º 4.887/03, in verbis (…)”

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Caso Lagoa dos Campinhos (SE)

SENTENÇA
Justiça Federal em Sergipe
Ação Ordinária nº 2008.85.00.001626-6
Autor: José João Nascimento Lima
Réu: Incra
Data da sentença: 14/05/2011
Comunidade quilombola envolvida: Lagoa dos Campinhos (SE)

Trecho da decisão:

A referida Convenção não versa apenas sobre povos indígenas, mas também sobre outros povos “cujas condições sociais, culturais e econômicas os distingam de outros setores da coletividade nacional, e que estejam regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes ou tradições ou por legislação especial”.

Destaque-se que o artigo 14 da Convenção 169 prevê expressamente o direito à propriedade das terras tradicionalmente ocupadas, além de contemplar a obrigação dos Estados de instituírem “procedimentos adequados no âmbito do sistema jurídico nacional para solucionar as reivindicações de terras formuladas pelos povos interessados”. Daí porque, pode-se afirmar que a Convenção 169 também confere suporte normativo para a edição do Decreto 4.887/03. E a referida Convenção por versar sobre direitos humanos, desfruta de hierarquia supralegal na ordem jurídica nacional, em conformidade com a mais recente orientação do STF nesta matéria.

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SENTENÇA
Justiça Federal no Rio Grande do Norte
Ação Ordinária n.º 2008.84.00.007538-4 ou 0007538-95.2008.4.05.8400
Autor: Elias de Azevedo da Cunha Filho
Réu: Incra e Associação de moradores de Acauã
Data da decisão: 30/11/2011
Comunidade quilombola envolvida: Acauã (RN)

Trecho da decisão:

Neste contexto, a Convenção da OIT, mesmo se não fosse autoaplicável o art. 68 do ADCT, daria eficácia ao dispositivo, regulando o direito reconhecido pela Constituição aos remanescentes de quilombolas, como “povos tribais”. Há, nesse sentido, julgado recente do TRF – 4.ª Região,24 afirmando que “a Convenção nº 169-OIT deve servir de parâmetro para avaliar a disciplina do art. 68 do ADCT. A Convenção, por sua vez, plenamente aplicável aos quilombolas, porque incluídos estes na disposição do art. 1.1.’a’ como ‘povos tribais’, no sentido de serem aqueles que, ‘em todos os países independentes, cujas condições sociais, culturais e econômicas os distingam de outros setores da coletividade nacional, e que sejam regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes ou tradições ou legislação especial’.

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ACÓRDÃO

Tribunal Regional Federal – 4ª Região
Agravo de Instrumento n.º 2008.04.00.010160-5/PR
Agravante: Incra
Agravado: Cooperativa Agrária Industrial e outros
Data do acórdão: 30/07/2008
Comunidade quilombola envolvida: Paiol da Telha (PR)

Trecho da decisão:

CONSTITUCIONAL. REMANESCENTES DE COMUNIDADES DE QUILOMBOS. ART. 68-ADCT. DECRETO Nº 4.887/2003. CONVENÇÃO Nº 169-0IT.
(…)
4. CONVENÇÃO Nº 169-OIT. Plena aplicabilidade do tratado internacional de proteção de “comunidades tradicionais”, não destoando o Decreto nº 4.887/2003 de seus parâmetros fundamentais: a) auto-atribuição das comunidades envolvidas; b) a conceituação de territorialidade como garantidora de direitos culturais; c) o reconhecimento da plurietnicidade nacional.

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SENTENÇA
Justiça Federal/MA
Mandado de Segurança n.º 2006.37.00.0052222-7
Impetrante: Joisael Alves e outros
Impetrado Diretor-Geral do Centro de Lançamento de Alcântara
Comunidades quilombolas envolvidas: comunidades de Alcântara (MA)
Data da sentença: 13/02/2007

Trecho da sentença:

(…) De efeito, não pode o Estado negligenciar a proteção constitucionalmente eleita como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, qual seja, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, idade e quaisquer formas de discriminação” (CF/88, art. 3º, IV), incluindo, assim, as comunidades remanescentes de quilombos, máxime quando, conforme destacado pelo ilustre Representante Ministerial em seu Parecer, pelo Estado Brasileiro estou confirmado seu entendimento em estabelecer políticas públicas voltadas ao combate à discriminação dos modos de vida tradicionais dos povos indígenas e tribais, quando da edição do Decreto Legislativo nº 143/2002, ratificando a Convenção nº 169/ da OIT, que dispões em seu art. 14 que ‘deverão ser reconhecidos os direitos de propriedade e posse dos povos em questão sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

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