De acordo com o monitoramento realizado pela CPI-SP, mais de 90% das famílias quilombolas no Brasil não habitam áreas regularizadas. Diante desse cenário, o Ministério Público Federal (MPF) nos Estados tem cobrado judicialmente maior celeridade na conclusão dos processos de titulação de terras quilombolas.


Caso Alto Trombetas (Oriximiná-PA)

ACÓRDÃO
6ª Turma TRF-1ª Região
Apelantes: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e União Federal
Apelado: Ministério Público Federal
Informações: http://processual.trf1.jus.br/
Data: 16/05/2016
Comunidade Quilombola: Alto Trombetas (PA)

Trecho:

VI – Não cabe ao Poder Público invocar a cláusula da reserva do possível com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, salvo nas hipóteses de justo motivo objetivamente comprovado, o que não é o caso dos autos em que os Recorrentes apenas suscitam inviabilidade orçamentária de acordo com seu juízo de conveniência e oportunidade, sem demonstrar, mediante detalhamento orçamentário, a impossibilidade de cumprir com sua obrigação constitucional de promover os atos necessários à conclusão ou definição do procedimento administrativo instaurado para identificar, reconhecer, delimitar, demarcar e titular as terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, regulamentado pelo Decreto nº 4.887/2003.

VII – A despeito do conflito de interesses advindo da titulação da propriedade de comunidades remanescentes de quilombo alegadamente sobreposta à área de preservação ambiental, o lapso temporal de mais de oito anos de trânsito do processo no âmbito da Câmara de Conciliação de Arbitragem da Administração Federal, sem que se aponte solução definitiva no horizonte administrativo, configura mora da Administração e autoriza o Poder Judiciário a estipular prazo razoável para a conclusão do procedimento porque não é lícito à Administração Pública prorrogar indefinidamente a finalização dos atos de sua responsabilidade, tendo em vista o direito dos administrados ter seus requerimentos apreciados em tempo razoável, a teor do art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”. A propósito, o princípio da razoável duração do processo, proveniente da Emenda Constitucional nº 45/2004, harmoniza-se com a cláusula do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) e da eficiência (art. 37, caput, CF). Além disso, ostenta prerrogativa de cláusula pétrea, é autoaplicável e almeja impedir que decisão tardia converta-se em injustiça. Ademais, está previsto no art. 8º do Pacto de São José da Costa Rica e é tutelado pela Excelsa Corte ao assentar que “O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do “due process of law”.” (HC 83773, Relator:  Min. CELSO DE MELLO, 2ª Turma, DJ 06-11-2006 PP-00049).

SENTENÇA
2ª Vara Federal de Santarém
Ação Civil Pública n.º 0004405-91.2013.4.01.3902
Autor: Ministério Público Federal
Réu: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Fundação Cultural Palmares e União Federal
Informações: http://portal.trf1.jus.br/
Data da decisão: 24/02/2015
Comunidade Quilombola: Alto Trombetas (PA)

Trecho da decisão:

Requer a condenação das rés a dar continuidade às atividades de regularização da terra quilombola. Tal pedido deve ser acolhido, conforme exposto no precedente acima transcrito, em razão da mora ora reconhecida, sendo fixado o prazo de dois anos para conclusão das tratativas, conforme requerido na inicial. (…)

É o que ocorre no caso. O ato ilícito, consistente na mora para conclusão do processo de titulação, está demonstrada, conforme exposto acima. Também o resultado lesivo às comunidades remanescentes de quilombos, cujos integrantes vivem as incertezas e inseguranças decorrentes da falta de definição quanto à titularidade das áreas por si reivindicadas.

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Caso das Comunidades “Buraquinhos” e “São Félix” (Chapada Gaúcha-MG)

ACÓRDÃO
5ª Turma TRF-1ª Região
Apelante: Ministério Público Federal (MPF)
Apelado: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
Informações: http://processual.trf1.jus.br/
Data: 07/03/2018
Comunidades Quilombolas: Buraquinhos (MG) e São Félix (MG)

Trecho:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE TERRAS OCUPADAS POR COMUNIDADES DE REMANESCENTES DE QUILOMBOS. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. OCORRÊNCIA. CONTROLE
JURISDICIONAL.

(…)

VI – Não cabe ao Poder Público invocar a cláusula da reserva do possível com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, salvo nas hipóteses de justo motivo objetivamente comprovado, o que não é o caso dos autos em que os Recorrentes apenas suscitam inviabilidade orçamentária de acordo com seu juízo de conveniência e oportunidade, sem demonstrar, mediante detalhamento orçamentário, a impossibilidade de cumprir com sua obrigação constitucional de promover os atos necessários à conclusão ou definição do procedimento administrativo instaurado para identificar, reconhecer, delimitar, demarcar e titular as terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos de que trata o art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, regulamentado pelo Decreto nº 4.887/2003.

VII – A despeito do conflito de interesses advindo da titulação da propriedade de comunidades remanescentes de quilombo alegadamente sobreposta à área de preservação ambiental, o lapso temporal de mais de oito anos de trânsito do processo no âmbito da Câmara de Conciliação de Arbitragem da Administração Federal, sem que se aponte solução definitiva no horizonte administrativo, configura mora da Administração e autoriza o Poder Judiciário a estipular prazo razoável para a conclusão do procedimento porque não é lícito à Administração Pública prorrogar indefinidamente a finalização dos atos de sua responsabilidade, tendo em vista o direito dos administrados ter seus requerimentos apreciados em tempo razoável, a teor do art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”. A propósito, o princípio da razoável duração do processo, proveniente da Emenda Constitucional nº 45/2004, harmoniza-se com a cláusula do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF) e da eficiência (art. 37, caput, CF). Além disso, ostenta prerrogativa de cláusula pétrea, é autoaplicável e almeja impedir que decisão tardia converta-se em injustiça. Ademais, está previsto no art. 8º do Pacto de São José da Costa Rica e é tutelado pela Excelsa Corte ao assentar que “O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do “due process of law”.” (HC 83773, Relator:  Min. CELSO DE MELLO, 2ª Turma, DJ 06-11-2006 PP-00049).

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Caso Charco (São Vicente Férrer-MA)

ACÓRDÃO
5ª Turma TRF-1ª Região
Apelantes: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra)
Apelado: Ministério Público Federal (MPF)
Informações: http://processual.trf1.jus.br/
Data: 03/05/2017
Comunidade Quilombola: Charco (MA)

Trecho:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.  AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA DE TERRAS OCUPADAS POR COMUNIDADES DE REMANESCENTES DE QUILOMBOS. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. OMISSÃO DO PODER PÚBLICO. OCORRÊNCIA. CONTROLE JURISDICIONAL. POSSIBILIDADE.

I – A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que se afigura legítima a atuação do Poder Judiciário, visando suprir eventual omissão do Poder Público, na implementação de políticas públicas, mormente em se tratando do exercício de garantia constitucional, como no caso, em que se busca dar eficácia ao direito de propriedade das terras ocupados por comunidades de quilombolas.
II – As comunidades de remanescentes de quilombos, por força do Texto Constitucional, constituem patrimônio cultural brasileiro (CF, art. 216, incisos I, II, e respectivos parágrafos 1º e 5º), sendo-lhes assegurada, ainda, a propriedade das terras tradicionalmente ocupadas, nos termos do art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, impondo-se ao Poder Público a adoção das medidas necessárias à efetividade dessa garantia constitucional.
III – Na hipótese dos autos, a omissão do Poder Público, cristalizada pela inércia do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA quanto à prática dos atos administrativos necessários à efetiva conclusão do procedimento administrativo instaurado com a finalidade de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas pela comunidade de quilombolas descrita nos autos, afronta o exercício pleno desse direito, bem assim, a garantia fundamental da razoável duração do processo, com os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, no âmbito judicial e administrativo (CF, art. 5º, inciso LXXVIII), a autorizar a estipulação de prazo razoável para a conclusão do aludido procedimento.
IV – Apelação e remessa oficial desprovida. Sentença confirmada.

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Caso Pedro Cubas (Eldorado-SP)

SENTENÇA
1ª Vara Federal de Registro
Ação Civil Pública n.º 0006478-69.2013.403.6104
Autor: Ministério Público Federal (Procurador Felipe Jow Namba)
Réu: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária e União Federal
Informações: http://www.jfsp.jus.br
Data da decisão: 22/02/2016
Comunidade Quilombola: Pedro Cubas (SP)

Trecho da sentença:

Ainda que não haja no Decreto nº 4.887/2003 prazo para a confecção do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação – RTID, dada a sua complexidade, não é razoável uma demora de aproximadamente 11 (onze) anos para sua conclusão.
(…)
Tampouco se aplica à hipótese a fórmula da reserva do possível que não pode ser invocada para legitimar o injusto inadimplemento de deveres estatais constitucionalmente impostos.Aliás, a demora na elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação – RTID não se justifica pelas alegações de acúmulo de processos administrativos ou carência de pessoal, que podem, quando muito, gerar algum atraso, persistindo, contudo, o direito ao término do procedimento em tempo razoável.

Sobre o tema a Constituição Federal, em seu art. 5º, LXXVIII, dispõe que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Em outras palavras, a Constituição Federal garante a todos no âmbito judicial ou administrativo a razoável duração do processo. Desse modo, indevida a demora excessiva/injustificada no andamento/conclusão do procedimento administrativo, que não deve se estender injustificadamente, devendo terminar em prazo razoável, principalmente porque a indefinição acerca da delimitação da área em questão gera insegurança para a comunidade quilombola.

Diante desse quadro fático em que constatada conduta ilegal e abusiva na condução do procedimento administrativo em questão, é razoável determinação para que a Administração Pública conclua a elaboração do Relatório Técnico de Identificação e Demarcação – RTID e o publique no prazo de 6 (seis) meses, respeitando posteriormente o Poder Público os prazo estabelecidos no Decreto nº 4.887/2003 e, quando não determinados, aqueles estabelecidos pela Lei nº 9.784/199, que regula o processo administrativo no âmbito federal.

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