Como a transição energética pode impactar a Amazônia?
Nova publicação alerta que a transição para a chamada “energia limpa” exigirá o aumento da extração de diversos minérios, muitos deles situados na Amazônia, com o risco de acirramento de conflitos socioambientais na região
A Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP) lança nova publicação que discute como as políticas de transição energética impactam a demanda por alumínio e de sua matéria-prima, a bauxita. Os autores, Luiz Jardim Wanderley e Pedro Catanzaro Rocha Leão, buscam compreender como o incremento na produção de alumínio afetará a extração mineral na Amazônia brasileira com foco no município paraense de Oriximiná, onde se encontra a maior produtora de bauxita do país.
Com sua mais recente publicação, a CPI-SP se soma às vozes que alertam para os riscos envolvidos no aumento da produção mineral para assegurar a substituição de combustíveis fósseis para outras formas de energia. As políticas de transição energética precisam considerar que a mineração é uma atividade que gera significativos impactos e conflitos socioambientais que poderão ser amplificados nos próximos anos, principalmente em países do Sul Global.
Além disso, há de se destacar que o enfrentamento da crise climática não se resume a substituição de fontes energéticas, mas envolve lidar com uma série de questões sistêmicas e profundas, como a desigualdade entre o Sul e o Norte Global; um questionamento da atual intensidade do consumo de bens; superação da dependência do transporte individual motorizado; ampliação da reciclagem; a maior eficiência energética, entre outras.
O que é transição energética?
Para o alcance da meta do Acordo de Paris de um crescimento máximo de 1,5ºC nas temperaturas médias globais até 2100 se projeta uma política geral de transição energética de combustíveis fósseis para outras formas de energia – majoritariamente solar e eólica – e com a massificação de carros, maquinários e equipamentos elétricos, tanto em edificações como no processo produtivo.
Por que serão necessários mais minerais?
A transição energética produzirá um aumento na demanda de minerais, uma vez que usinas solares fotovoltaicas, parques eólicos e veículos elétricos requerem mais recursos minerais em sua composição do que outras instalações e veículos. E para conectar as novas estruturas de geração de energia aos centros consumidores urbanos e industriais será preciso expandir a malha de transmissão de energia elétrica. Além disso, a transição exigirá a substituição das frotas de veículos em circulação na atualidade, uma vez que não se pretende, a princípio, apostar na adaptação da frota existente.
Qual o papel do alumínio?
Apesar dessa nova arquitetura tecnológica da energia renovável eletrificada demandar diferentes minérios para sua construção, a grande demanda ocorrerá principalmente sobre cobalto, lítio, cobre, chumbo, níquel, terras raras e alumínio. O alumínio poderá ter um crescimento mundial de 29% na demanda até 2030.
Matéria-prima do alumínio
A matéria prima do alumínio é a bauxita. Após extraída, a bauxita é refinada em um produto intermediário, a alumina, para em seguida ser fundida em alumínio.
Hoje, o Brasil é o quarto maior produtor de bauxita do mundo. O país possui a quarta maior reserva internacional do minério, atrás de Guiné, Austrália e Vietnã. O Estado do Pará detém aproximadamente 75% das reservas nacionais.
A bauxita no subsolo da floresta
A Amazônia é importante produtora de bauxita e poderá sofrer com o crescimento dos conflitos socioambientais por conta da nova demanda, com desmatamento de áreas de floresta nativa habitada por populações tradicionais, elevação do número e volume de barragens de rejeitos e demanda por fontes de energia.
A maior produtora de bauxita do Brasil, a Mineração Rio do Norte (MRN) está situada no município de Oriximiná, no interior do Pará. A MRN, ao longo dos seus mais de 40 anos de operação, já causou a mudança da cobertura do solo em 10,8 mil hectares para extração mineral e instalação de barragens de rejeito e infraestrutura dentro da atual Floresta Nacional de Saracá Taquera, em áreas originalmente utilizadas por comunidades quilombolas e ribeirinhas. A nova demanda por alumínio pode acelerar a extração das minas da MRN, aumentando a produção de rejeitos, o desmatamento, e agravando os danos socioambientais sobre as comunidades locais.