CONFLITOS COM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

Em diferentes períodos, unidades de conservação foram sendo criadas dentro de territórios quilombolas em Oriximiná onde vivem mais de 4.000 quilombolas em 16 comunidades. A primeira delas foi a Reserva Biológica do Rio Trombetas criada em 1979. Na ocasião, algumas famílias chegaram a ser expulsas com violência de suas casas. Apesar da repressão dos órgãos ambientais, os quilombolas resistiram e continuaram explorando os recursos naturais da área transformada em Unidade de Conservação de Proteção Integral.

Dez anos mais tarde, em dezembro de 1989, o presidente José Sarney instituiu a Floresta Nacional Saracá-Taquera. Mesmo tendo sido criada já na vigência do artigo 68 do ADCT da Constituição Federal, que reconhece o direito dos quilombolas à propriedade de suas terras, a existência dessa população não foi considerada pelo governo federal. As duas Unidades de Conservação Federal estão sobrepostas aos territórios quilombolas Alto Trombetas I e Alto Trombetas II.

Posteriormente, em 2006, o governo do Pará criou a Floresta Estadual Trombetas e Floresta Estadual de Faro originalmente sobrepostas aos territórios quilombolas Ariramba e Cachoeira Porteira.

A sobreposição com as Unidades de Conservação tem dificultado à titulação dessas terras em nome dos quilombolas. A reivindicação das comunidades é a revisão dos limites de tais unidades de forma a excluir a área de ocupação quilombola e garantir a sua titulação em seu nome.

Manifestação na cidade de Santarém (PA), em 2016, pede agilidade na titulação dos territórios. Foto: Carlos Penteado

Unidades de Conservação Estaduais

O governo do Estado do Pará assumiu o compromisso de rever os limites das Florestas Estaduais  (Flota) a fim de assegurar a regularização das Terras Quilombolas Ariramba e Cachoeira Porteira. Para isso apresentou à Assembleia Legislativa o Projeto de Lei 04/2017 determinando a exclusão dos dois territórios quilombolas do perímetro das Flotas. O projeto de lei foi aprovado pelo Legislativo em novembro de 2017 e sancionado pelo governador Simão Jatene em 11 de janeiro de 2018 – confira o texto da Lei 8.595/2018.

Dessa forma, foi viabilizada a titulação da Terra Quilombola Cachoeira Porteira em fevereiro de 2018 e da Terra Quilombola Ariramba em março de 2018.

Unidades de Conservação Federais

No âmbito federal, o ICMBio e o Ministério do Meio Ambiente criaram sucessivos obstáculos para o andamento dos processos das Terras Quilombolas Alto Trombetas I e Alto Trombetas II. Em 2007, o ICMBio encaminhou este e outros casos de unidades de conservação sobrepostas à terras quilombolas para a Câmara de Conciliação da Advocacia Geral da União. No entanto, em 2015, os processos foram encerrados sem conciliação. Nesses oito anos, enquanto o processo de titulação das terras quilombolas permaneceu paralisado, a exploração em escala comercial de minério e madeira prosseguiu na Flona Saracá-Taquera. Em 2013, o Ibama concedeu a Licença de Operação para a Mineração Rio do Norte extrair bauxita no platô Monte Branco parcialmente incidente em terra quilombola sobreposta à Flona.

Em fevereiro de 2015, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região em Santarém determinou que o governo federal concluísse no prazo de dois anos o procedimento para titulação das terras ocupadas pelas comunidades quilombolas do Alto Trombetas. A decisão foi tomada no âmbito de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal em 2013. Em 16 de maio de 2016, o TRF-1 confirmou a decisão.

A decisão da justiça motivou a retomada do processo de negociação para a busca de uma alternativa para conciliar os direitos dos quilombolas e a existência de duas Unidades de Conservação. Dessa vez, o diálogo não se restringiu aos órgãos de governo (ICMBio, Incra, Ministério do Meio Ambiente e Fundação Cultural Palmares), mas contou com a participação e o protagonismo das lideranças quilombolas das TQs Alto Trombetas I e Alto Trombetas II. Um dos primeiros resultados foi a publicação pelo Incra dos Relatórios de Identificação e Delimitação dos territórios em 2017. E, finalmente, em 2018, o Incra publicou as portarias de reconhecimento.

Outro avanço concreto veio a ocorrer vários anos mais tarde com a formalização de Termo de Compromisso entre as associações quilombolas e o ICMBio estabelecendo as regras de uso compartilhado da porção da Reserva Biológica do Rio Trombetas que se sobrepõe ao território quilombola. O termo com a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Alto Trombetas II foi assinado em 2022 e o termo com a Associação Mãe Domingas foi formalizado em 2024.

Quilombo Tapagem, localizado no interior da Flona de Saracá-Taquera. Foto: Carlos Penteado

Para saber mais sobre os conflitos envolvendo comunidades tradicionais e a Flona de Saracá-Taquera, baixe o livro Floresta Nacional de Saracá-Taquera: a quem se destina? Conflitos entre uso tradicional e exploração empresarial