As lideranças planejaram estratégias comuns para enfrentar os impactos da mineração em Oriximiná, no norte do Pará. A poluição dos cursos d’água e o risco das 26 barragens ali existentes estão entre as principais preocupações.

Ribeirinhos da Comunidade Boa Nova, Oriximiná, Pará (Foto: Carlos Penteado/CPI-SP)

Reunidas nos dias 23 e 24 de outubro, lideranças quilombolas e ribeirinhas do município de Oriximiná (Pará) compartilharam as experiências de suas comunidades e discutiram estratégias articuladas para demandar da Mineração Rio do Norte (MRN) e do Poder Público medidas para mitigar os impactos de 40 anos de mineração de bauxita na sua região. O encontro foi promovido pela Comissão Pró-Índio de São Paulo. “A nossa expectativa é que o encontro contribua com o fortalecimento dessa parceria que teve início em 2016”, explica Lúcia Andrade, coordenadora-executiva da ONG.

Maria de Fátima Viana Lopes, liderança da comunidade Boa Nova, uma das localidades ribeirinhas situadas abaixo das barragens da MRN, aponta a importância da aliança quilombolas e ribeirinhos “Juntos, nós tivemos força para reivindicar nossos direitos”. Fátima destaca os resultados: “Sem essa aliança nossa comunidade não teria tido o avanço em questão da prevenção de rompimento da barragem da mineração. A parceria ajudou com que a Mineração Rio do Norte tivesse mais responsabilidade com nosso povo. Não resolvendo totalmente, mas amenizando a situação”. “Nós esperamos que essa aliança permaneça e traga novas conquistas para a nossa comunidade”, completa a coordenadora.

Uma das deliberações do encontro foi a decisão de propor à Mineração Rio do Norte a criação de uma Mesa de Diálogo Permanente com participação das comunidades atingidas, suas assessorias e a empresa. A proposta será apresentada nos próximos dias à mineradora por meio de carta assinada pelos participantes.

Moradores da comunidade ribeirinha Saracá (Foto: Carlos Penteado/CPI-SP)

Expansão da área de extração do minério
Além dos problemas decorrentes da extração já em curso, ribeirinhos e quilombolas se preocupam com os impactos socioambientais que virão com a exploração de novas áreas de floresta nos platôs Aramã (já licenciado) e Novas Minas (em licenciamento).

Os trabalhos da mineradora no platô Aramã surpreenderam os moradores das comunidades ribeirinhas São Francisco, São Tomé, São Sebastião e Espírito Santo. A Licença de Operação foi concedida pelo Ibama para a MRN em dezembro de 2018. Os ribeirinhos não foram informados ou consultados embora a extração esteja prevista em área tradicionalmente utilizada pelas comunidades. “A gente não estava sabendo de nada”, relatou Jesi, vice coordenador da comunidade São Francisco. O comunitário contou que as comunidades já contabilizam prejuízos “o primeiro impacto foi perder a liberdade de andar pelo nosso território”. E complementa “a água está suja, a caça já era”.

Já a extração de bauxita nos platôs do projeto Novas Minas, com início previsto para 2025, se dará dentro de território quilombola declarado pelo Incra em 2018. Os estudos de impacto ambiental e o Estudo do Componente quilombola ainda estão sendo elaborados pela Mineração Rio do Norte como parte do processo para obtenção da licença ambiental.

Barragem de mineração ao lado do Quilombo Boa Vista (Foto: Carlos Penteado/CPI-SP)

Barragens seguem como preocupação
A existência de 26 barragens de mineração e os projetos da Mineração Rio do Norte de ampliar ainda mais o número de barragens é motivo de grande apreensão para os quilombolas e ribeirinhos. A empresa já solicitou ao Ibama autorização para construção de uma nova estrutura para os rejeitos, a SP 25. “Isso preocupa mesmo. Acredito que em nossa situação talvez não morra ninguém caso aconteça um rompimento. Digo morte imediata, mas sobreviver nesse lugar vai ser impossível ”, avalia Maria de Fátima Viana Lopes, coordenadora da comunidade Boa Nova que se encontra a jusante do conjunto de barragens.  José Domingos da direção da Associação Comunitária dos Produtores Rurais do Médio Lago Sapucuá complementa “indenização nenhuma vai pagar a nossa água, o nosso líquido precioso. Se a gente mudar, vai morar num prédio e ficar preso. Aqui eu vivo solto. E se poluir a água não vai ser só na minha comunidade. Vai ser todo mundo”.

Recentemente, a Mineração Rio do Norte informou à Comissão Pró-Índio de São Paulo que irá rever os atuais Planos de Ação de Emergência e elaborar os Planos de Contingência e Recuperação até agosto de 2020. As fragilidades dos atuais planos no que diz respeito às avaliações de impactos e medidas previstas para a população local foram apontadas pela ONG em livro publicado no final do ano passado. “Já apontamos a importância da MRN assegurar espaço para a participação dos quilombolas e ribeirinhos no processo de elaboração dos estudos” pondera Lúcia Andrade, da Comissão Pró-Índio. “Os planos formalizam os compromissos da empresa em caso de falha de suas barragens por isso é fundamental que sejam definidos em diálogo com a população da zona de risco”, complementa.

Enquanto isso, a mineradora dá os primeiros passos na preparação das comunidades para eventuais falhas nas suas barragens. No primeiro semestre de 2019, a Mineração Rio do Norte iniciou a implementação de medidas de emergência no Quilombo Boa Vista que fica a 400 metros de uma das barragens. Foram instaladas sinalizações nas rotas de fuga e realizado um simulado na comunidade. Porém, a preocupação da comunidade permanece “Ainda não é aquela conquista 100%, mas a gente tem uns avanços”, contou Amarildo dos Santos, coordenador da Associação da Comunidade Quilombola Boa Vista. “A gente fez o treinamento, mas vemos muitas falhas ainda no processo. Por exemplo, se arrebentar essa barragem, precisa correr para o ponto mais alto, mas o ponto mais alto seria no campo e lá não tem estrutura nenhuma que possa estar amparando as pessoas. Se arrebentar as casas de baixo, para onde essas pessoas iriam? São coisas que têm que melhorar” se preocupa Amarildo.

Nos próximos meses, a empresa dará continuidade as ações em Boa Vista e iniciará o treinamento nas comunidades ribeirinhas Boa Nova e Saracá.

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