Os processos para titulação das terras quilombolas em Oriximiná tramitam no Incra há mais de 10 anos. O impasse entre ICMBio e Incra tem impossibilitado a finalização do processo, mas não tem impedido que o governo autorize a mineração nas terras quilombolas

Manifestação dos Quilombolas de Oriximiná, abril de 2016
Foto: Carlos Penteado

O julgamento ocorreu nessa segunda-feira (16/05) e, segundo o Ministério Público Federal, confirmou a sentença da Justiça Federal de Santarém de 2015 que deu prazo de dois anos para a titulação das terras quilombolas no Alto Trombetas, em Oriximiná. A decisão foi tomada no âmbito de Ação Civil Pública proposta pelo Ministério Público Federal.

A União, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) haviam recorrido da decisão alegando, entre outras coisas, limitações financeiras. De acordo com o Ministério Público Federal, os órgãos argumentaram também que não podiam ser obrigados a pagar R$ 90 mil em danos morais coletivos porque, entre outras alegações, as comunidades quilombolas não teriam tido prejuízos. Mas, ainda segundo o MPF, o Tribunal manteve o dano moral coletivo porque a demora interminável da União para finalização do processo de titulação da área quilombola tem impedido até mesmo a aplicação de políticas públicas, como saúde e educação, já que a própria União tem condicionado tais direitos ao reconhecimento territorial.

Espera-se que a decisão do TRF-1 motive Incra e ICMBio a dar andamento aos processos das Terras Quilombolas Alto Trombetas e Alto Trombetas 2, já que até maio de 2016 (mais de um ano após à sentença da Justiça Federal em Santarém), nenhuma medida havia sido adotada pelo Incra e ICMBio para cumprir a decisão judicial.

ICMBio tem impedido a titulação mas autorizado a mineração

“Para liberar mineradora, madeireira, o governo tem uma caneta. Tem caneta para liberar tirar bauxita para tirar madeira, mas para titular a terra quilombola não tem caneta. Nós queremos nossa terra titulada” Aluízio Silvério, liderança quilombola.

As Terras Quilombolas Alto Trombetas e Alto Trombetas 2 estão sobrepostas a Reserva Biológica do Rio Trombetas e a Floresta Nacional Saracá-Taquera. A reivindicação das comunidades é a revisão dos limites de tais unidades de forma a excluir a área de ocupação quilombola e garantir a sua titulação em seu nome.

Em 2007, o ICMBio contestou a titulação de diversas terras quilombolas por causa da sobreposição com Unidades de Conservação – entre elas as de Oriximiná – levando a questão até a Câmara de Conciliação da Advocacia Geral da União. As tentativas de conciliação entre ICMBio e Incra – que em nenhum momento contaram com a participação dos quilombolas de Oriximiná – foram infrutíferas e oito anos depois, em 2015, a Advocacia Geral da União encerrou os processos de conciliação.

Nesses oito anos, enquanto o processo de titulação das terras quilombolas permaneceu paralisado, o Ministério do Meio Ambiente autorizou a exploração minerária e abriu a concessão para exploração de madeireira na Flona Saracá-Taquera. Em 2013, o Ibama concedeu a Licença de Operação para a Mineração Rio do Norte extrair bauxita no platô Monte Branco parcialmente incidente em terra quilombola sobreposta à Flona.

Enquanto as titulações não são concluídas, os quilombolas vivenciam um cotidiano de restrições decorrentes da sobreposição com as Unidades de Conservação. Não podem também obter a Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), que é utilizada como instrumento de identificação do agricultor familiar para acessar diferentes políticas públicas de inclusão produtiva. Além disso, denunciam casos de abuso de autoridade e violência por parte dos fiscais do ICMBio.

Mineração ameaça quilombolas e a floresta

“Se hoje existem florestas preservadas é por causa dos negros e dos índios. Nós queremos um pedaço de terra para viver, não para acabar com elas, como as grandes mineradoras”, Manoel Santos de Jesus, liderança quilombola.

Toda a área de exploração da Mineração Rio do Norte – a maior produtora de bauxita do Brasil – encontra-se no interior da Floresta Nacional Saracá-Taquera. A MRN tem como acionistas as empresa Vale, Rio Tinto, South32, Alcan, Hydro, Alcoa e a Companhia Brasileira de Alumínio e implantou-se em Oriximiná nos anos 1970.

Desde 2012, a sua expansão alcança áreas sobrepostas aos territórios quilombolas incidentes na Floresta Nacional Saracá-Taquera. Estimativas indicam que as concessões da MRN abrangem 8% da dimensão dos territórios quilombolas e 27% da Floresta Nacional Saracá-Taquera. A extração da bauxita implica o total desmatamento da floresta e a escavação do solo por mais de 8 metros até alcançar a área do minério.

Em 2013, a Mineração Rio do Norte obteve do Ministério do Meio Ambiente licença para explorar o platô Monte Branco parcialmente incidente em Terra Quilombola. Em março de 2016, o Ministério do Meio Ambiente autorizou a empresa MRN a proceder os estudos que viabilizarão a licença ambiental para a extração de bauxita em mais quatro platôs em terras quilombolas a partir de 2021.

Na carta aberta divulgada em 27 de abril de 2016 os quilombolas reivindicam que o governo não autorize qualquer empreendimento em suas terras até a titulação. Somente com a regularização de suas terras, os quilombolas terão a segurança jurídica para debater com a mineradora e o governo o futuro que se planeja para essas áreas.

Extração de bauxita pela Mineração Rio do Norte em Oriximiná
Foto: Carlos Penteado

Saiba mais sobre o caso no site da Comissão Pró-Índio de São Paulo

Assista ao Vídeo da Campanha Terra Titulada Demarcada Já
Com informações do MPF e G1