Quilombolas de Família Magalhães (GO) enfrentam onze anos de morosidade do Incra na titulação de suas terras. Enquanto isso, sofrem com os impactos ambientais de atividades ilegais de mineração.

Preparação de comida para Festa de São Sebastião. Foto: Daniela Perutti
A difícil história da luta pela terra dos mais de cem quilombolas de Família Magalhães parece não ter fim. Já sofreram ameaças de pistoleiros, ações de despejo, e há décadas resistem para permanecerem em seu território.
Há onze anos, os Magalhães foram reconhecidos pelo estado brasileiro como quilombolas e, em 2006, tiveram o processo de titulação de suas terras aberto pelo Incra. Foi preciso aguardar seis anos para, em novembro de 2012, terem decretada pela presidenta Dilma Rousseff a desapropriação de suas terras, de modo que três imóveis ali incidentes fossem desapropriados.

Até o momento, as ações de desapropriação não foram sequer ajuizadas. O Incra alegou a necessidade de realizar uma vistoria antes, de modo a levantar as propriedades incidentes no território bem como verificar a existência de possíveis posseiros a serem reassentados. No ano de 2013, a vistoria não foi iniciada, e o Incra passou um ano e meio sem tomar nenhuma medida em relação ao processo de titulação dessa comunidade. No segundo semestre de 2014, deram início à vistoria da área e, um trabalho que costuma durar, no máximo, dois meses (segundo informações de funcionários do Incra), se estende até hoje (dezembro de 2015) sem que tenha sido concluído. Segundo o Incra, a vistoria em andamento identificou outro possível proprietário ou posseiro e será necessário uma nova visita ao local para a identificação da situação.

Caminho para titular uma terra quilombola no Brasil

Em março de 2014, a comunidade encaminhou um abaixo-assinado ao superintendente regional do Incra no Distrito Federal, Marco Aurélio Bezerra da Rocha, com cópia enviada ao Ministério Público Federal, pedindo providências e esclarecimentos, mas não obteve qualquer retorno por parte dele.
Enquanto isso, atividades irregulares de extração de areia vêm ocorrendo dentro do quilombo, e têm degradado uma área cada vez mais ampla. O Rio Areia, fundamental para o abastecimento de água de parte da comunidade, está severamente ameaçado pelo assoreamento provocado com a mineração.
Sem o título da terra e sem o devido amparo do Estado brasileiro, os quilombolas de Família Magalhães sentem-se impotentes para conter o avanço da extração de areia, além de inseguros para ocuparem as áreas que ainda não foram desapropriadas. “A demora do Incra tá prejudicando nós demais! Porque os outros estão usando [o território] e a gente não planta nada, não cria nada!” – diz Isabela Pereira dos Santos, quilombola de Família Magalhães. E, para piorar a situação, práticas de extração de madeira e pesca predatória têm ocorrido indiscriminadamente em suas terras.
Seu José Magalhães acredita que a única maneira da vida de sua comunidade melhorar, é com o título da terra. “Sem a terra nós não trabalhamos, não criamos. Os outros não vão deixar trabalhar. Saindo o título, a gente pode plantar pasto, fazer roça. Sem o título não pode fazer investimento nenhum, porque não tem segurança”, lamenta.
José Magalhães e o irmão. Foto: Daniela Perutti.
O Incra informou à Comissão Pró Índio de São Paulo que a vistoria da área será concluída em 16 de fevereiro, precedida do ajuizamento das ações de desapropriação, previsto para 31 de maio de 2016, apenas no caso de haver recurso orçamentário disponível. Já no que diz respeito à titulação da área, o órgão preferiu não informar uma previsão, pois isso dependeria da evolução do caso na esfera judicial.
Festa de São Sebastião. Foto: Daniela Perutti.
Expediente
Texto: Daniela Perutti
Edição: Carolina Bellinger
Fotos: Daniela Perutti
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