Em encontro promovido pela Comissão Pró-Índio de São Paulo, mulheres quilombolas reafirmaram o seu papel na promoção dos direitos de suas comunidades.

Nos dias 30 de setembro e 01 de outubro, 37 mulheres quilombolas dos municípios de Oriximiná e Óbidos refletiram sobre a importância e a contribuição das mulheres nas lutas das comunidades dessa região do Pará, onde ocorreu a primeira titulação de uma terra quilombola no Brasil, a TQ Boa Vista, em Oriximiná.

O encontro foi promovido pela Comissão Pró-Índio de São Paulo com o apoio da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Oriximiná (ARQMO), da Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Óbidos (ARQMOB), da Associação das Mulheres Trabalhadoras do Município de Oriximiná (AMTMO) e do Coletivo Pretas Marias. O evento reuniu mulheres que, desde 2021, se encontram mensalmente em rodas de conversa em formato híbrido para discutir temas de relevância para as mulheres quilombolas e ribeirinhas dos dois municípios.

A primeira mesa do encontro “Memória: contribuição das mulheres nas lutas quilombolas de Oriximiná e Óbidos” contou com os depoimentos das quilombolas Irene Maria Viana Pinheiro, Maria Zuleide Viana dos Santos, Verinha Oliveira dos Santos e Nilza Nira Melo de Souza e a coordenação de Carlene Printes.

Irene, do Quilombo Boa Vista Cuminã em Oriximiná, rememorou essa história: “Essa luta foi bem sofrida, porque nós não tínhamos dinheiro para deixar com os filhos. Nós saímos de barco, só eu de mulher, deixava meus filhos, íamos visitar os quilombos”. Ela lembrou também dos avanços: “as conquistas das mulheres são várias, como a volta à educação. Fizemos uma campanha para as mulheres estudarem. Nós conquistamos no coletivo. Fomos parceiras, uma fortalecendo a outra. Temos hoje advogadas, sociólogas, assistente social, professoras. Então, nossa luta não começou agora”.

E Verinha, integrante da coordenação da ARQMOB, também compartilhou sua trajetória e destacou a importância do apoio da família nessa caminhada: “A luta de Óbidos também não foi uma luta muito fácil. Eu sou mãe de 6 filhos, meu caçula tem 32 anos. Eu sou uma mulher muito abençoada porque eu sempre tive alguém da minha família que ficava com meus filhos quando eu precisava sair. Porque eu sempre gostei de participar desses encontros, desse movimento. Tem algo que cutuca a gente, precisamos fazer algo, não podemos parar”.

Já Zuleide, do Quilombo Boa Vista (Oriximiná), lembrou como os antigos resistiam: “na época eles não sabiam ler, escrever, mas faziam a denúncia deles com música” e a descoberta da constituição: “a gente descobriu que o negro tinha direito nas terras onde ele habitava. A gente descobriu na constituição e fomos em busca de nossos direitos”.

Mesa “Memória: contribuição das mulheres nas lutas quilombolas de Oriximiná e Óbidos” (Foto: acervo CPI-SP)

Já a segunda mesa “Nos dias de hoje: lutas, desafios e expectativas das mulheres quilombolas” contou com a presença das lideranças quilombolas Carlene Printes (ARQMO/Malungu – Coordenação Estadual das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombo do Pará); Cleuciele Batista dos Santos (Associação das Comunidades Remanescentes de Negros da Área das Cabeceiras); Lenivalda de Souza Xavier (AMTMO); Luciane Printes (Coletivo Pretas Marias); e Wanderly de Aquino Andrade (Associação dos Remanescentes de Quilombos Muratubinha, Mondongo e Igarapé Açu dos Lopes).

Carlene compartilhou sua experiência como filha de quilombolas comprometidos com a luta: “A minha vida foi por esse caminho, não foi algo que eu planejei. Eu acho que eu nasci nesse movimento”. Carlene destacou também a importância da experiência dos antigos: “Tudo o que eu faço eu busco ter o aval das pessoas que vieram antes de mim. Eles já vieram antes então eu respeito muito a história de luta deles. E o que eles fizeram lá atrás que deu certo e a gente precisa dar continuidade. Meu papel é esse, de dar continuidade a esse legado”.

Também Cleuciele apontou como foi sua trajetória para se engajar no movimento: “eu tenho 26 anos e sou secretaria da ACORNECAB. Em 2013, eu já era auxiliar do meu pai, que trabalhava na associação. Do meu jeito eu fui aprendendo, no tempo que eu tinha. Aí eu comecei a participar, ser chamada para reunião, já vendo que tudo aquilo que meu pai, meu tio fizeram, tinham um porquê. E é bom a gente entrar enquanto jovem porque a gente aprende as coisas”. Ela também destacou a importância das mulheres para o movimento quilombola: “Nós mulheres temos que mostrar nossa força, porque somos guerreiras. Precisamos ocupar os espaços. Eu sempre digo que não paro em casa, para onde me chamam eu estou indo. Sempre perguntam ‘quando você volta’, e eu não sei”.

Mesa “Nos dias de hoje: lutas, desafios e expectativas das mulheres quilombolas” (Foto: acervo CPI-SP)

O último momento do encontro foi dedicado à discussão sobre as próximas iniciativas da articulação de mulheres quilombolas de Óbidos e Oriximiná. Entre as propostas, foi levantada a necessidade de seguir com as rodas de conversa com as mulheres e a importância da continuidade da luta pela titulação dos territórios.

Participantes do Encontro de Mulheres Quilombolas em Santarém (Foto: acervo CPI-SP)

Somos resistência – encontro de mulheres quilombolas

Santarém, 30 de setembro a 1 de outubro de 2022

Promoção:
Comissão Pró-Índio de São Paulo

Apoio:

  • Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Oriximiná
  • Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombos de Óbidos
  • Associação das Mulheres Trabalhadoras do Município de Oriximiná
  • Coletivo Pretas Marias

Apoio financeiro:

  • Embaixada da Noruega
  • Misereor
  • Rainforest Foundation Norway
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